Carminha,
Minha queridíssima amiga, desculpe não ter respondido as suas cartas nos últimos dois anos. Não foi por falta de querer, mas é que faltava algo de bom ou de surpreendente que eu pudesse te contar. E tem mais, sinceramente, não queria que você nem ninguém soubessem de mim.
Minha queridíssima amiga, desculpe não ter respondido as suas cartas nos últimos dois anos. Não foi por falta de querer, mas é que faltava algo de bom ou de surpreendente que eu pudesse te contar. E tem mais, sinceramente, não queria que você nem ninguém soubessem de mim.
Se ainda bem te conheço uma hora dessas você já dever estar ofegante, coração acelerado e imaginando as possibilidades mais dramáticas possíveis. “Será que ela está com alguma doença terrível?”, “Talvez esteja paraplégica, cega, muda”, “Quem sabe não possa ter filhos” . Não, não, nada disso! O que aconteceu foi que me apaixonei. Isso mesmo, minha cara, foi paixão daquelas mais cadelas, daquelas que deixam a gente entre a loucura e a loucura.
Você acompanhou a minha história com o Marco e certamente lembra que quebrei todos os CDs da coleção de jazz do rapaz e no outro dia pichei no muro da casa dele dizeres de amor. Sempre vivi nesse morde e assopra, não sei se amei alguém, mas eu sempre amei as histórias de amor que vivi. E depois teve aquele affair com a Melissa, você bem sabe. Quando dei por mim estava na parada gay de São Paulo levantando uma bandeira de arco íris. E nem tinha me dado conta que ela era mulher, também pra mim pouco importava. Eu amava o amor e o amor não tem sexo.
Carminha, só que dessa vez foi diferente. A minha paixão não foi homem e nem mulher. Eu me apaixonei pela dor. Imagina que abandonei tudo, absolutamente tudo. Larguei os projetos da Ong, nunca mais fui à academia, não atendi nenhum telefonema, pedi demissão da redação, cortei todos os vínculos mais próximos com parentes e amigos. Me certifiquei que não teria nenhum compromisso porque eu queria era viver vinte quatro horas com a dor e pela dor.
Alguns poucos amigos aqui de Laranjeiras quiseram se solidarizar com a minha dor, mas a dor era só minha e eu não a dividiria com ninguém. Passei dias e noites revirando essa dor e alimentando-a com os meus ressentimentos e culpas de estimação. O que eu queria mesmo era um Grand Finale. Quis que deus e o diabo se comovessem comigo.
Hoje eu sei que era pura pretensão da minha parte, achar que eu pudesse morrer com a dor me qualiando todo o sangue. A vida nem sempre imita a arte por mais que a gente se esforce pra que isso aconteça
Sem mais a dizer, eu tô me sentindo muito sozinha, a dor se foi e eu senti a dor de não ter nem a dor dentro do peito. Peço que me responda o mais rápido possível, mas não me pergunte o motivo da dor que senti. Mande lembranças para o Paulinho e pra a Ju.
Abraço apertado da sua Sintia
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