sexta-feira, 24 de outubro de 2008

CARTA - DESABAFOS DE UMA MÃE


Filha,

Já escrevi diversas cartas, mas no final das contas nunca tive coragem de remetê-las. Imagino que provavelmente você ainda esteja muito magoada com tudo que aconteceu. E eu tenho medo que as minhas palavras, meu suplico, meu pedido de perdão não sejam suficientes para fechar as feridas. (E com certeza não serão). Mas te peço, como último favor, que ao menos leia essa carta até o final.

A sociedade em que vivemos tem a péssima mania de colocar as mães acima do bem e do mal, como se fossem seres divinos. Mas as mães também odeiam, erram, e sofrem de egoísmo, como no meu caso. Você ainda será mãe e perceberá que não existe essa fantasia de que as mulheres já nascem prontas para serem mães. A maternidade é um exercício diário que só se aperfeiçoa ao longo do tempo. A gente a aprende a ser mãe, assim como aprende a ser filho.

A lembrança que guardo comigo é de quando você tinha uns quatro aninhos. Lembro-me que fui até o portão do antigo prédio onde vocês moravam e fiquei uns 20 minutos observando você brincar no parquinho. Vi que aquela menininha, a minha filha, era muito quietinha. Você não corria tanta quanto às outras crianças, era tranqüila e com um olhar meigo e carinhoso, um olhar que nunca mais vi igual. Depois disso viajei para a Holanda e nunca mais te vi, pelo menos não com os olhos daqui.

Mesmo longe, nesses 18 anos, sempre pensei em você. Algumas vezes liguei pro seu pai para saber notícias suas. Ele sempre fez questão de mostrar que você estava bem e reforçar que a minha ausência na vida de vocês era o melhor pra todos. E por algum tempo acreditei nessa versão, mas hoje, mais madura, acredito que a ausência de uma mãe nunca será o melhor para uma filha, ainda que essa mãe seja eu.

Não sei o que seu pai e a esposa dele contaram pra você a meu respeito, mas pelo jeito com que me tratou quando te liguei há um ano atrás, imagino que não tenha uma boa imagem a meu respeito. E também nem tenho a pretensão que você passe a ver uma mulher que vende o corpo pra viver como uma candidata a boa mãe. Nada que eu fale pode mudar o que você sente por mim, mas nada que eu faça com o meu corpo vai mudar o fato de eu ser mãe, de eu ser a sua mãe.

Quero uma chance de conversar com você e te contar coisas que não podem ser ditas numa carta. Eu abro mão de todo o dinheiro e conforto que consegui aqui nesse país. Eu largo tudo, eu largo todos. Eu volto pro Brasil agora mesmo se você disser que sim. Se você disser sim ao meu pedido de ser sua mãe. Pense nessa chance pra nós duas. Fique com Deus e saiba que eu te amo.

Sua mãe

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